'O testemunho de São Estevão nos oferece algumas indicações para a nossa oração e para a nossa vida', disse Bento XVI
O Papa Bento XVI deu continuidade nesta quarta-feira, à série de catequeses sobre a oração nos Atos dos Apóstolos. Desta vez, o Santo Padre concentrou seu discurso sobre a oração de Santo Estevão, o primeiro mártir cristão.
"No momento do seu martírio, narrado nos atos dos apóstolos, se manifesta, mais uma vez, a fecunda relação entre a Palavra de Deus e a oração", destacou o Santo Padre.
Bento XVI explicou o conteúdo do discurso proferido por Estevão pouco antes do seu martírio e também salientou que a oração feita pelo mártir estava em profunda ligação com aquela proferida por Jesus no alto da cruz.
"A vida e o discurso de Estevão de repente se interrompem com o apedrejamento, mas exatamente o seu martírio é o cumprimento da sua vida e da sua mensagem: ele se torna uma coisa só com Cristo", disse.
Ao final da catequese, o Pontífice apresentou a vida de Estevão como modelo a ser seguido por todas as pessoas que desejam estreitar os laços de comunhão com Deus.
"Queridos irmãos e irmãs, o testemunho de São Estevão nos oferece algumas indicações para a nossa oração e para a nossa vida. Podemos nos perguntar: de onde este primeiro mártir cristão trouxe forças para enfrentar os seus perseguidores e chegar à doação de si mesmo? A resposta é simples: do seu relacionamento com Deus", concluiu.
Mirticeli Medeiros
Da Canção Nova
Catequese de Bento XVI - Oração de Estevão - 02/05/12
Boletim da Santa Sé
(Tradução: Mirticeli Medeiros - equipe do CN notícias)
CATEQUESE
Praça de São Pedro
Vaticano
Quarta-feira, 02 de maio de 2012
Queridos irmãos e irmãs,
Nas últimas catequeses vimos como, na oração pessoal a comunitária, a leitura e a meditação da Sagrada Escritura abram à escuta de Deus que nos fala e infundem luzes para entender o presente. Hoje gostaria de falar do testemunho e da oração do primeiro mártir da Igreja, Santo Estevão, um dos sete escolhidos para o serviço da caridade junto aos necessitados. No momento do seu martírio, narrado nos atos dos apóstolos, se manifesta, mais uma vez, a fecunda relação entre a Palavra de Deus e a oração.
Estevão foi conduzido ao tribunal, diante do Sinédrio, onde foi acusado de ter declarado que “Jesus destruiria este lugar, (o templo), e mudaria os costumes que Moisés havia transmitido” (At 6,14). Durante a sua vida pública, Jesus havia efetivamente preanunciado a destruição do templo de Jerusalém: “Destruais este templo e em três dias eu o farei ressurgir” (Jo 2,19). Todavia, como destaca o evangelista João, “ele falava do templo do seu corpo. Quando, depois, ressuscitou dos mortos, os seus discípulos se recordaram que havia dito aquilo, e acreditaram nas Escrituras e na palavra dita por Jesus” (Jo 2, 21-22).
O discurso de Estevão diante do tribunal, o mais longo dos atos dos apóstolos, se desenvolve exatamente a partir dessa profecia de Jesus, o qual é o novo templo, inaugura o novo culto, e substitui, com a oferta que faz de si mesmo sobre a cruz, os sacrifícios antigos. Estevão quer demonstrar como seja infundada a acusação que lhe foi dirigida de mudar a lei de Moisés e ilustra a sua visão da história da salvação, da aliança entre Deus e o homem. Ele relê então toda a narração bíblica, itinerário contido na Sagrada Escritura, para mostrar que isso conduz ao lugar da presença definitiva de Deus, que é Jesus Cristo, em particular a sua paixão, morte e ressurreição. Nesta prospectiva, Estevão lê também o seu ser discípulo de Jesus, seguindo-o até o martírio. A meditação sobre a Sagrada Escritura lhe permite compreender a sua missão, a sua vida, o seu presente. Nisto ele é guiado pela luz do Espírito Santo, pelo seu relacionamento íntimo com o Senhor, tanto que os membros do Sinédrio viram o seu rosto “como de um anjo” (At 6,15). Tal sinal de assistência divina, faz alusão ao rosto irradiante de Moisés descendo do Monte Sinai após ter encontrado Deus. (Ex 34,29-35; II Cor 3,7-8).
No seu discurso, Estevão parte do chamado de Abraão, peregrino em direção à terra indicada por Deus e que a teve como posse somente em nível de promessa; passa depois a José, vendido pelos irmãos, mas assistido e libertado por Deus, para chegar a Moisés, que se torna instrumento de Deus para libertar o seu povo, mas encontra também e mais vezes a rejeição da sua gente. Nestes eventos narrados pela Sagrada Escritura, diante da qual Estevão demonstra estar em religiosa escuta, emerge sempre Deus, que não se cansa de ir ao encontro do homem apesar de encontrar frequentemente uma obstinada oposição. E isso no passado, no presente e no futuro.
Portanto, em todo o antigo testamento, ele vê a prefiguração da situação vivida pelo próprio Jesus, o Filho de Deus que se fez carne, que - como os antigos pais – encontra obstáculos, rejeição, morte. Estevão se refere ainda a Josué, a Davi e a Salomão, que estão relacionados à construção do templo de Jerusalém, e conclui com as palavras do profeta Isaías (66,1-2): “O céu é o meu trono e a terra escabelo dos meus pés. Como casa poderá construir-me, diz o Senhor, a qual será lugar do meu repouso? Não é porventura a minha mão que criou todas estas coisas?” (At 7,49-50). Na sua meditação sobre o agir de Deus na história da salvação, evidenciando a perene tentação de rejeitar Deus e a sua ação, ele afirma que Jesus é o Justo anunciado pelos profetas; nEle Deus mesmo se fez presente em modo único e definitivo: Jesus é o “lugar” do verdadeiro culto. Estevão não nega a importância do templo por um certo tempo, mas sublinha que “Deus não habita em construções feitas pela mão do homem” (At 7,48). O novo e verdadeiro templo no qual Deus habita é seu Filho, que assumiu a carne humana, é a humanidade de Cristo, o Ressuscitado que recolhe os povos e os une no Sacramento do Seu Corpo e do seu Sangue. A expressão a respeito do templo “não construído por mãos de homens”, se encotnra também na teologia de São Paulo e na Carta aos Hebreus: o corpo de Jesus, o qual Ele assumiu para sofrer ele mesmo como vítima do sacrifício para expiar os pecados, é o novo templo de Deus, o lugar da presença de Deus vivente; nEle Deus e homem, Deus e o mundo estão realmente em contato: Jesus toma sobre si todo o pecado da humanidade para levá-lo no amor de Deus e para queimá-lo neste amor. Aproximar-se da cruz, entrar em comunhão com Cristo, quer dizer entrar nesta transformação. E isto é entrar em contato com Deus, entrar no verdadeiro templo.
A vida e o discurso de Estevão de repente se interrompem com o apedrejamento, mas exatamente o seu martírio é o cumprimento da sua vida e da sua mensagem: ele se torna uma coisa só com Cristo. Assim a sua meditação sobre o agir de Deus na história, sobre a Palavra Divina que em Jesus encontrou seu pleno cumprimento, se torna uma participação à mesma oração da Cruz. Antes de morrer, de fato exclama: “Senhor Jesus, recebas o meu espírito” (At 7,59), apropriando-se das palavras do Salmo 31 v.6 e revivendo a última expressão de Jesus no Calvário: “Pai, em tuas mãos entrego meu espírito” (Luc 23,46); e enfim, como Jesus, grita em alto e bom som diante daqueles que o estavam apedrejando: “Senhor, perdoa-lhes os pecados” (At 7,60). Notamos que, se de um lado a oração de Estevão retoma aquela de Jesus, diferente é o destinatário, porque a invocação é dirigida ao próprio Senhor, isto é, a Jesus que ele contempla glorificado à direita do Pai: “Eis, contemplo os céus abertos e o Filho do homem que está à direita de Deus” (v.55).
Queridos irmãos e irmãs, o testemunho de São Estevão nos oferece algumas indicações para a nossa oração e para a nossa vida. Podemos nos perguntar: de onde este primeiro mártir cristão trouxe forças para enfrentar os seus perseguidores e chegar à doação de si mesmo? A resposta é simples: do seu relacionamento com Deus, da sua comunhão com Cristo, da meditação sobre a história da salvação, do ver o agir de Deus, que em Jesus Cristo chegou ao cume. Também a nossa oração deve ser sempre nutrida pela escuta da Palavra de Deus, na comunhão com Jesus e sua Igreja.
Um segundo elemento: São Estevão vê preanunciada, na história do amor entre Deus e o homem, a figura e a missão de Jesus. Ele – o Filho de Deus – é o templo “não feito pela mão do homem” no qual a presença de Deus Pai se fez próxima ao ponto de entrar na nossa carne humana para levar-nos a Deus, para abrir-nos as portas do céu. A nossa oração, então, deve ser a contemplação de Jesus à direita de Deus, de Jesus como Senhor da nossa, da minha existência cotidiana. Nele, sob a guia do Espírito Santo, podemos também nos voltarmos a Deus, realizar um contato real com Deus com a confiança e o abandono dos filhos que se dirigem a um Pai que os ama em modo infinito. Obrigado.
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